terça-feira, maio 22, 2012

E a CPI não vai chamar Serra/Kassab/Richa?

A estratégia da mídia é igualar o petista Agnelo e peemedebista Sérgio Cabral ao tucano Maconi Perillo, esse último atolado até o pescoço no cachoeiragate. Para ser coerente com essa estratégia, devia-se acrescentar nessa seara os tucanos José Serra e Beto Richa, o aliado serrista Gilberto Kassab, além do homem forte do governo mineiro, Danilo de Castro.

Serra e Kassab foram mais generosos com a construtora Delta do que Cabral, além do contrato bilionário no lixo paulistano. Além disso, é incompreensível a conivência da mídia o tucano Beto Richa, o governador que tentava contornar a proibição dos jogos ilegais para o esquema Cachoeira no Estado do Paraná. E Danilo de Castro aparece nas gravações das negociatas de Cachoeira em Minas Gerais.

Mas qual a legitimidade da mídia pautar a CPI quando parte dela está sob suspeita por envolvimento com o esquema?

sexta-feira, maio 18, 2012

Por Alberto Carlos Almeida, publicado no Valor Econômico

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acaba de ser agraciado com o prêmio John W. Kluge, conferido pela Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, a mais completa do mundo. A declaração do chefe da biblioteca acerca do premiado é paradigmática: "Em termos puramente científicos e acadêmicos, ele tem que ser considerado o mais notável cientista político da América Latina no fim século XX. Não só é a primeira pessoa com uma carreira política pessoal relevante a ganhar este prêmio, como é também um representante acabado do que chamamos cientista social. Se quisermos fazer uma comparação americana, ele é como Thomas Jefferson, desempenhando um papel-chave na construção de uma democracia com fundamentação acadêmica".

Isso foi suficiente para que os tucanos que desprezam o PT passassem a comparar Fernando Henrique com Lula em função do fato de o ex-presidente petista ter recebido recentemente os títulos de doutor honoris causa de várias universidades do Rio de Janeiro. O prêmio de Fernando Henrique, segundo tais críticos, revelaria claramente sua superioridade em relação a Lula e, acrescentaria eu, provavelmente do PSDB sobre o PT.

É curiosa a insistência de alguns segmentos do PSDB no desprezo em relação ao PT. Lula é um animal exclusivamente político. Ele não está preocupado sobre quem tem mais títulos de universidades ou de bibliotecas renomadas. Os títulos que Lula detém são os três mandatos presidenciais consecutivos do PT. Na política, é isso que de fato importa e deveria ser considerado pelos adversários do PT - se tiverem realmente o desejo de competir de igual para igual.

Uma das marcas mais importantes da trajetória política de Lula e do PT é a ousadia. As decisões da pessoa de Lula e da instituição por ele construída e liderada são a prova mais cabal de que, na política, ser ousado traz resultados benéficos. Os críticos deste argumento afirmam que Collor também ousou, e se deu mal. É evidente que sim: Collor não tinha com ele uma instituição sólida, um partido consolidado. Afinal, nada mais distante disso do que o PRN ao qual ele pertencia. Ousadia funciona, sim, desde que combinada com uma ideologia clara e uma instituição forte.

O primeiro grande risco tomado por Lula foi fundar um partido inteiramente novo. O PT nasceu fora da tradição política intelectual da esquerda brasileira e também fora do berço do sindicalismo ligado ao setor público. O líder principal do novo partido nunca lera Karl Marx (ainda bem) e a sua base social, diferentemente do que ocorrera nos anos 1960, eram os sindicatos do setor privado. Ele foi produto da industrialização do Brasil e, não por acaso, seu berço é a região do ABC paulista.

A história é bem conhecida e cabe aqui apenas pontuar alguns episódios de tomada de risco do novo partido e de seu principal líder: disputar uma eleição para governador em 1982 sem acesso a recursos políticos relevantes; disputar uma eleição presidencial, em 1989, nessas mesmas condições, enfrentando e derrotando líderes de renome e com grande estrutura, tal como acontecera com Brizola; entrar em confronto direto com toda a elite política brasileira, atacando de forma incessante o FMI, o pagamento da dívida externa e políticas econômicas adotadas recorrentemente no Brasil. Todas essas ações de alto risco poderiam ter resultado na extinção do PT. Foi o contrário que ocorreu: o partido cresceu na adversidade e desde que foi fundado aumenta a cada eleição o número de deputados federais, senadores, deputados estaduais e prefeitos. Atualmente, o PT tem a maior bancada de deputados federais e o maior número de deputados estaduais, quando se somam todas as unidades da Federação.

Uma das maiores ousadias do PT foi quebrar a velha tradição conciliatória da elite política tradicional brasileira. Nosso sistema político, o presidencialismo de coalizão, atua como uma força centrípeta, que leva os principais atores para o centro político, para a conciliação e para a acomodação. O PT sabe, sem sombra de dúvidas, atuar dentro de nossas instituições. Foi esse saber que permitiu que Lula e Dilma tivessem maioria parlamentar. O PT foi, porém, o partido do conflito quando esteve na oposição e hoje, no governo, é o partido com maior sede de ampliar seu espaço político. Faz alianças, sim, mas está pronto para conquistar o terreno político que pertence a alguns de seus aliados. Não há nenhum mal nisso. Da mesma maneira que os empresários de sucesso são reconhecidos porque têm a ambição de fazer suas empresas crescerem e conquistarem mais mercado, os políticos e os partidos de sucesso cultivam o desejo incessante de conquistar mais e mais poder. Ninguém está proibido de se comportar assim, nem a oposição.

Lula assumiu a Presidência em 2003 e fez uma inflexão política formidável: manteve grande parte da política econômica de Fernando Henrique, aumentou o superávit primário, de 3,75% para 4,25%, controlou o gasto social e expulsou quatro parlamentares que votaram contra a reforma da previdência aprovada pelo PT, mas sempre defendida pelo PSDB. Os expulsos foram Luciana Genro, Babá, João Fontes e a então senadora Heloísa Helena. Haja ousadia. A moderação de Lula em seu primeiro mandato foi crucial para o sucesso econômico de seu governo e, consequentemente, para sua reeleição.

Lula não parou aí. Seus principais colaboradores, José Dirceu e Antonio Pallocci, foram abatidos, respectivamente, pelos escândalos do mensalão e do caseiro. Sem eles, Lula escolheu Dilma Rousseff para disputar sua sucessão. Sua ministra da Casa Civil jamais tinha concorrido em uma eleição. Para muitos analistas políticos, não houve risco maior do que este. Lula ousou e venceu.

Dilma está seguindo os mesmos passos de seu pai político: demitiu vários ministros por conta de escândalos de corrupção, está tentando adotar uma política econômica diferente de seu antecessor, fez uma inserção inédita no Dia das Mães em cadeia de rádio e TV e passou a adotar medidas concretas para reduzir os juros. Não cabe aqui discutir se a redução de juros por meio da regulação estatal é correta ou não. Alguns dirão que sim, argumentando que a oferta de crédito no Brasil é extremamente concentrada. Outros dirão que não, porque o governo estaria agindo contra as regras da economia de mercado. Não é isso que está em discussão aqui, mas sim o caráter politicamente ousado da decisão.

O PT, guiado por seu instinto de sobrevivência, adota o método da tentativa e erro - pelo visto, menos erros do que tentativas. Eis a CPI do Cachoeira. Mais uma vez, os analistas se puseram a afirmar que se tratou de um tiro no pé dado por Lula. Será mesmo? Na política, não existe o contrafactual, não existe o "se". Ainda assim, poderíamos fazer um pequeno exercício e imaginar o que a mídia estaria falando hoje se não existisse a CPI. É óbvio que o noticiário estaria inteiramente dominado por notícias ligadas ao julgamento do mensalão. Do ponto de vista exclusivamente midiático, a CPI do Cachoeira já alcançou seu principal objetivo. O recesso parlamentar se inicia em meados de julho e, a partir daí, as eleições municipais se tornarão a principal notícia. Até lá, a eventual exposição negativa do PT e de seus políticos ao julgamento do mensalão terá sido minimizada. Por outro lado, o governo Dilma reagiu com rapidez (e ousadia) às denúncias que recaíam sobre a construtora Delta, por se tratar da principal contratada para muitas das obras do PAC.

Os adversários do PT deveriam, antes de menosprezá-lo, procurar entendê-lo melhor. Desconsiderar suas virtudes é a maneira mais fácil de continuar sofrendo derrotas eleitorais consecutivas. As forças políticas precisam ser avaliadas também em função de sua eficácia. Há razões muito claras que vêm levando o PT a ser mais eficaz do que seus adversários: a ousadia é uma delas, não a única.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e "O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo".


Comentário do blogueiro: O artigo do cientista político ligado aos tucanos é alerta para os integrantes do PSDB. Não basta estar certo no varejo, é preciso defender causas certas no atacado. Não basta a crítica pela crítica, é preciso apresentar o que faria diferente e melhor. O principal problema do PSDB é ficar sempre à reboque da agenda da mídia. Como a agenda midiática muda constantemente, o partido fica sem agenda, perdido, atirando para todos os lados. Ter a mídia a seu favor é vantagem, porém, é preciso saber tirar proveito disso. E o PSDB não está sabendo fazer. O que é vantagem tem se tornado em desvantagem, uma vez que eliminou a capacidade de reflexão do partido. Quando a presidenta Dilma faz um movimento contrário aos juros exorbitantes, aparecem tucanos criticando-a, dando a ideia para o eleitorado que está do outro lado do balcão, os banqueiros. Não importa se a estratégia presidencial é acertada ou errada, o que importa é o movimento, a direção. Os erros e excessos são corrigidos no meio do caminho, sem maiores consequências, desde que a direção esteja correta. E, nesse simples exemplo, evidencia-se que os tucanos teimam em permanecer na direção errada, contrária aos interesses da maioria, de trabalhadores a empresários.